Domingo é dia de cozinhar e almoçar com refugiados da Síria

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02 de julho de 2018

Ontem foi dia de cozinhar e almoçar com os refugiados que vivem na Suíça. A atividade integra o projeto Cook & Eat Together, do Grupo Sem Fins Lucrativos Jazz. Eles organizam regularmente atividades voltadas para integrar os asilados à nova comunidade em que vivem.
O convite é extensivo a todos, suíços e estrangeiros de todas as nacionalidades residentes em qualquer cidade ou vilarejo no país. Como ontem foi um domingo de muito calor, muitos suíços não compareceram ao almoço, preferiram se refrescar nos lagos, rios de piscinas. Aqui é assim, quando o sol brilha, fica difícil manter o pessoal dentro das casas. Mas isso é pauta para outro texto…
Vítimas da guerra e da discriminação
Esse tipo de projeto é muito importante. Essas pessoas ainda são vistas com muito preconceito. Após sobreviverem à guerra, à fuga e encontrar um lugar onde viver, elas têm que resistir à intolerância. Alguns acham que elas são terroristas, outros que os homens são estupradores de crianças suíças. Eu mesma já presenciei cartazes em pontos de ônibus no meu vilarejo alertando os moradores do perigo que seria ter refugiados morando perto de onde brincam as crianças locais.
Mas esses cidadãos são, infelizmente, vítimas de uma guerra que assola a Síria há sete anos, na qual 400 mil pessoas foram mortas ou desapareceram. Se não bastasse o conflito em si, para piorar esse grupo específico de sírios curdos sofre com uma perseguição turca, que fez uma forte ofensiva em janeiro deste ano e produziu mais 15 mil refugiados, segundo reporta a mídia internacional.
A maioria presente ontem era de famílias de sírios curdos. Mas conversei também com alguns do Iêmen. Emocionante saber que essas pessoas conseguiram deixar seus países em guerra, atravessaram uma distância de 3.5 mil e estão hoje em segurança e junto de seus filhos e esposas.
Como ontem foi um primeiro contato, não pude perguntar como eles chegaram, se de barco, de avião, andando, enfim. Tampouco pude saber o que exatamente aconteceu para eles tomarem a decisão de ir embora e o porquê vieram especificamente para a Suíça. Só me restou então a observação.
Impressões
Alguns chegaram há três anos e outros há dez meses. As muitas crianças já falavam alemão fluentemente; conversavam e brincavam no dialeto suíço e não mais em seus idiomas de origem. Muitas nasceram já em solo Helvético. Os pais, ao contrário, fazem curso e falam ainda com certa dificuldade. As mães têm menos fluência ainda na língua; precisam ficar em casa com os filhos e têm menos chance de estudar.
Por saírem menos e terem pouco contato com o mundo, se mostraram mais fechadas a pessoas de fora como eu. Então aproveitei para conversar mesmo com os homens, com idades que variavam entre 30 e 50 anos. Todos pais, maridos ou jovens que tentavam iniciar uma nova vida em outro lugar.
Conversamos sobre a Copa do Mundo, minha vida aqui, se eu tinha marido, onde ele estava, e eventualmente eles falavam sobre suas vidas… Queriam saber tudo sobre o Brasil. Enquanto falávamos de vidas tão diferentes, meu filho Pedro (8 anos) e eu ajudávamos a cortar pepino, tomate e rabanetes para uma deliciosa salada síria que já não me lembro o nome.
Em meio a tantas conversas, fiquei pensando em seus dramas. Mas também feliz em ver que eles estavam bem e tentando se integrar. Não sabemos as dores que viveram para chegar até aqui. Um deles me relatou que era engenheiro na Síria e agora já tem o visto de morador e busca trabalho. Era um dos que melhor falava alemão. Ele me contou que quando chegou viveu em um porão a 30 metros de profundidade, sem janela, mas que agora sua vida está caminhando muito bem. Eram todos muito orgulhosos de falarem quatro línguas. Muitos tinham nível universitário.
Ao ver tantas crianças, tive vontade de oferecer roupas e brinquedos praticamente intocados e que meus filhos não usam mais, mas fiquei com medo de ofender. Tive muita vontade de fazer mais perguntas, mas pensei melhor e não fiz. Não queria provocar tristeza só pela minha curiosidade. Queria ter conversado mais com as mulheres também.
Descobertas
A comida estava maravilhosa. Tinha um arroz maravilhoso com passas e cenoura, tinha Babaganoush, uma pasta de berinjela que eu amo e mais outras iguarias que eu não sei o nome. Nesse dia de tanta troca, descobri que meu filho adora ajudar na cozinha e que ele só não faz em casa porque eu nunca o chamo, segundo suas palavras. Ele fez um super amigo de 11 anos, um menino do Iêmen. Trocaram telefone e promessas de se verem depois das férias de verão.
Descobri que quero muito promover mais encontros. Saí dali com vontade de organizar um Cook & Eat Together de Comida Síria e Brasileira. Os organizadores adoraram a ideia. Aguardem então a deliciosa união de sabores e culturas.

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